“Partindo do princípio que o Universo é finito e que,
portanto, os recursos de potenciais simuladores também o são, há sempre a
possibilidade de o simulado conhecer os simuladores”. Essas são as últimas
linhas de um artigo publicado por físicos da Universidade de Cornell, EUA, onde
criam as diretrizes iniciais para a comprovação da hipótese de que o Universo é
uma gigantesca simulação computacional a partir de uma simulação numérica da
chamada “grade cromodinâmica quântica”, associada às forças básicas da natureza
que unem prótons e nêutrons no núcleo do átomo. Tal conclusão leva a
importantes implicações filosóficas gnósticas como, por exemplo, a atualização
por meio da tecnologia de uma ambição humana revelada pela Teurgia e Alquimia
na Antiguidade: imitar Deus para tentar encontrá-lo. Dessa vez, por meio da
simulação algorítmica.
Talvez Deus não queira ser observado. Acho que Ele não gosta de
curiosos” (Einstein)
Dessa vez é um grupo de físicos da Universidade de Cornell,
nos EUA, que afirma que conseguiu aperfeiçoar as diretrizes iniciais de um
método que comprovará que o Universo é uma gigantesca simulação computacional.
Não fosse o fato de que pesquisadores da Universidade de Washington concordaram
após investigar os dados da equipe de Cornell, poderíamos dizer que tudo isso
não passa de um boato.
Em novembro do ano passado, físicos da Universidade de Bonn,
Alemanha, anunciaram que procuravam uma “assinatura cósmica” a partir de uma
simulação computacional por meio de minúsculos espaços cúbicos (grade de Gauge)
que forneceria uma nova visão das partículas de alta energia. Dessa maneira,
eles levariam à frente a hipótese do professor da Universidade de Oxford, o filósofo
e matemático Nick Bostrom, que em artigo publicado em 2003 sustentava uma
fórmula probabilística de que uma outra civilização poderia ter simulado o
nosso Universo (veja links abaixo).
Pois em novembro do ano passado Silas Beane, Zohreh Davoudi
e Martin Savage publicaram o artigo “Contraints on the Universe as a Numerical
Simulation” (Cornell University Library, arXiv.org) onde observam as conseqüências
da hipótese do Universo como simulação numérica a partir da possibilidade de
que a próxima geração de computadores de alta performance possa simular a
chamada “grade de cromodinâmica quântica” e, dessa forma, observar como os
raios cósmico se refletem nessa estrutura.
O mistério dos Quarks
Essa “grade de cromodinâmica quântica” está associada à força
fundamental da natureza que dá origem à força nuclear forte entre prótons e
nêutrons, os núcleos e suas interações. Nisso tudo estão os misteriosos
“quarks” que constituiriam os prótons e nêutrons. Nunca foram observados
diretamente (efeito de “confinamento”), mas eles são somente “vistos” (quer
dizer, estimados matematicamente) em colisões provocadas em poderosos
aceleradores de partículas.
Pela teoria padrão da física moderna os quarks seriam os
tijolinhos que formariam uma quantidade enorme de partículas (hádrons) de
existência efêmera, com vida extremamente curta.
A Cromodinâmica quântica tenta descrever essas interações
fortes ao procurar uma simetria especial, um campo criado entre as cargas “de
cor” dos quarks – na verdade não seriam “cores” como percepção visual, mas um
certo posicionamento do quark na rede.
De acordo com o artigo, o que a equipe de Cornell pretende é
“investigar a hipótese de que somos uma simulação com o pressuposto de que o
desenvolvimento de simulações do Universo tem um paralelo com o desenvolvimento
dos cálculos da Rede Cromodinâmica Quântica” (BEANE, Silas, DAVOUDI, Zohreh e
SAVAGE, M. obra citada, p. 4).
Universo simulado e o Mal
O notável no artigo da equipe de físicos de Cornell é a
recusa da chamada Teoria das Cordas (modelo físico onde a partícula como base
da física tradicional é substituída pela noção de “corda” – blocos fundamentais
extensos e unidimensionais) como modelo para explicar a unificação das forças
que, segundo os autores, partiriam de um esquema reducionista “simples e
bonito”. Segundo eles, a exploração do modelo de universo simulado na paisagem
do vácuo estaria além desse reducionismo, ao mostrá-lo como finito.
Os físicos concluem o artigo dessa maneira: “partindo do
princípio que o Universo é finito e que, portanto, os recursos de potenciais
simuladores também o são, segue que o volume que contém uma simulação será
finito e o espaçamento de rede tem que ser diferente de zero e, portanto, em
princípio, há sempre a possibilidade de o simulado conhecer os simuladores” (p.
12.).
Apesar de o artigo afirmar que “ao contrário dos filósofos,
nós precisamos que as hipóteses sejam observáveis”, essas linhas finais guardam
uma riqueza filosófica importante.
O Universo simulado teria um fim?
Primeiro, a finitude do Universo e da extensão da própria
simulação. Em artigo publicado pela revista Nature em 2003, os dados do
satélite Wilkinson Microwave Probe da NASA identificaram que a radiação de
fundo deixada pelo Big Bang indica que as escalas máximas de temperatura
observadas no céu seriam menores do que produzidas por um Universo infinito. O
espaço não seria suficientemente grande para conter as ditas ondas. Pelo
contrário, um universo finito composto por pentágonos curvos unidos em uma
esfera se encaixaria com as observações: se alguma onda saísse do dodecaedro,
voltaria para a face oposta ao mesmo.
Há implicações filosóficas nessa hipótese do Universo ser um
modelo computacional finito: a confirmação da suspeita dos gnósticos de que o
cosmos físico é, na verdade, imperfeito não pela sua incompletude, mas por
conter, em si, o Mal por ser uma cópia imperfeita da Plenitude.
Para o Gnosticismo, a criação do mundo já é Queda pela
presença ontológica do Mal na sua própria constituição, existência e dinamismo.
Identificar o Mal com a existência material não significa incorrer na concepção
religiosa tradicional da oposição entre matéria/espírito, Verdade/Mentira,
Bem/Mal etc., num dualismo onde a matéria é considerada moralmente má por ser a
fonte do pecado e da decadência espiritual. Ao contrário, o Mal para o
Gnosticismo tem uma concepção Ontologia e não moral, isto é, o Mal é a essência
constitutiva do próprio cosmos físico. Isso significa que ele possui algo de
corrompido e falso desde o início.
A manifestação do Mal estaria presente na própria
reversibilidade irônica entre o Bem e o Mal em todos os sistemas: um vanish
point onde os sistemas ao assumirem um dado grau de complexidade revertem-se
contra si mesmos, e de forma perversa e maligna tornam-se inúteis e inertes. Um
fantasma que assombra todas as máquinas, uma entropia máxima do Universo
quando, de tão complexo, volta-se contra si mesmo.
Algoritmos podem voltar-se contra si mesmos?
Exemplos não faltam.
A Guerra pensada como solução final para a busca da Paz cria
um sistema militar tão complexo que se volta contra si mesmo, tornando-se uma
máquina autônoma que produz guerras continuamente.
Algo como a narrativa do livro de Franz Kafka O Processo
onde a máquina processual é tal gigantesca e complexa que nem o próprio sistema
consegue mais se lembrar dos motivos que levaram o protagonista a ser
processado.
Ou então a ameaça dos sistemas algorítmicos que de forma
invisível começam a controlar nossas vidas. O caso do comportamento dos algoritmos
da livraria virtual Amazon no início de 2011 foi um exemplo do caos que pode
ser estabelecido quando complexos algoritmos operacionais se tornam
inteligentes o suficiente para funcionarem sem intervenção humana. O algoritmo
que regula os preços da loja pareceu entrar em guerra consigo mesmo: os valores
dos produtos começaram a aumentar em competição uns com os outros, chegando o
livro The Making of Fly (sobre a biologia molecular de uma mosca) a custar US$
26,3 milhões.
E algoritmos programados para vender automaticamente ações
da bolsa frequentemente precisam ser interrompidos por “gatilhos de segurança”
que são acionados quando alguns deles “fogem do controle”.
Essa reversibilidade irônica entre Bem e Mal em todo e
qualquer sistema apenas confirmaria essa finitude dos recursos potenciais de
simulação do Universo. Tal qual um objeto refletido em um espelho despedaçado
que gera centenas de reflexos em seus fragmentos ou um fracta na geometria que
reproduz em seu fragmento o objeto original em sua totalidade, da mesma forma a
finitude da simulação cósmica é refletida na entropia de todos os sistema
tecnológicos, sociais, políticos ou econômicos.
Onde estão os simuladores?
Filme "Show de Truman": fugir da simulação
por meio de outra simulação
A segunda parte da conclusão dos físicos da Universidade
Cornell é igualmente rica em implicações filosóficas: a possibilidade do
simulado conhecer os simuladores, isto é, a hipótese de um Pluriverso onde, tal
qual Dorothy no filme “O Mágico de Oz” descobrimos quem está por detrás da
cortina manipulando os mecanismos de uma simulação.
Essa consequência prevista na hipótese dos físicos tem uma
direta analogia com a Teurgia e a Alquimia no mundo antigo. Nós, humanos, não
passaríamos de simulacros do Humano Primal, assim como o mundo dos nossos
sentidos é um simulacro do Mundo das Formas. Através do autoconhecimento ou
gnose poderíamos então retornar à Luz é à vida eterna possuída por Antropos,
esse humano essencial.
A Teurgia surge como a primeira forma de alcançar isso
através da manipulação da matéria onde, assim como o Demiurgo, podemos dar vida
e alma a uma forma material e inferior. Se temos dentro de nós uma parte desse
Anthropos, podemos retornar a ele exercendo as mesmas habilidades reservada aos
deuses: imitatio dei por generatio animae, imitar Deus criando vida.
Pois a simulação de uma simulação (uma meta-simulação) que
os físicos pretendem realizar poderia ser a atualização tecnológica desse velho
conteúdo esotérico. Mas com uma diferença: dessa vez, não criando vida, mas
simulando-a já que partimos agora do pressuposto que Deus/Demiurgo não fez a
vida – na verdade a simula em um gigantesco simulacro computacional cósmico.
Ao invés de imitatio dei por generatio animae teríamos agora
imitatio dei por generatio illudo (imitar Deus criando ilusão).
Um bom exemplo cinema é a estratégia de Truman para fugir do
Reality Show televisivo da sua vida em “Show de Truman”: dentro de um mundo
simulado, produz a “pura aparência”.
Diante das câmeras escondidas que monitoram sua vida, Truman simula que
dorme no porão da sua casa. No seu lugar coloca um boneco e desaparece: contra
um sistema de simulação, eventos igualmente simulados.
A hipótese dos físicos da Universidade de Conell parecer
pretender isso: para encontrar o Grande Simulador, só através da simulação.
Origem: http://cinegnose.blogspot.com.br/2013/06/fisicos-afirmam-que-o-universo-e-uma.html
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